quarta-feira, 30 de setembro de 2015

as eleições

Antes de entrarmos em período de reflexão, resolvi deixar aqui uns comentários.
1. Esqueçam as sondagens - estão a tornar-se uma coisa tipo os eventos do facebook - 2000 dizem que vão mas só 100 é que aparecem.
2. Esqueçam os debates - são comentários aos comentários e show-off televisivo.
3. Esqueçam as arruadas e as feiras - é tipo farmville - os vizinhos são todos simpáticos e os beijinhos são todos sinceros e as palavras todas verdade.
4. Esqueçam as promessas - eles dizem e desdizem como se de um dia para o outro apagassem o histórico e fosse tudo novidade.
5. Esqueçam as piadinhas e as histórias infantis - para isso há humoristas e o zigzag à hora do tempo de antena.
6. Esqueçam os esqueletos no armário - seja de que lado for, não chega um armário, é preciso um armazém.

Já esqueceram? Então digam-me agora o que sabem sobre as reais medidas de governação dos partidos. Pois é, esqueceram-se.

Agora pergunto-me eu para que raio andamos semanas a levar com os dentes arreganhados de uns e de outros se no fim nem sabemos em que raio estamos a votar!!!! No fim das contas não conhecemos os candidatos do nosso distrito, nunca sabemos que é que eles fazem quando eleitos, nem se valem o que lhes pagamos. Nunca escolhemos nada. Damos carta branca aos chefes dos partidos e aos amigos e compadres que nunca vimos mais gordos nem mais magros.

E anda o país nesta feira das vaidades e da maledicência a no domingo votamos- alguns de nós pelo menos - e depois rezamos para que não nos lixem muito nos próximos quatro anos.
Ah, a fundamental beleza da democracia!!!!

quinta-feira, 17 de setembro de 2015

os fans e os haters e o arrepio na espinha

Não gosto de fans, não gosto de haters. Verdade.
Não me lembro de ter sido fan de nada. (Para quem não sabe, fan vem de fanático)
Também nunca fui hater. É que nem os haters eu consigo odiar. Não está nos meus genes e muito menos na minha educação.
Há uns anos o meu afilhado, criança de uns 4, 5 anos, disse que era bom estar na minha casa porque "aqui vocês nunca gritam" - por nenhum motivo. Talvez por isso os gritos me deixam aflita.

Não vou falar novamente daqueles (principalmente homens) que se revelaram haters da melhor estirpe contra os refugiados. Também não vou falar dos fans que encontram desculpas para tudo. Vou falar de mim- nem fan nem hater.

Eu falo do arrepio na espinha. E o arrepio vem de cada vez que vejo uma foto, uma reportagem, uma notícia. Bem informada e refletida há coisas que me apetece deixar escritas.
1. a culpa maior é da guerra e da instabilidade geral dos países africanos e do médio oriente
2. a principal causa de muita desta confusão é a falta de organização e aí a UNHCR, a UE e os "países-porta" têm a maior culpa
3. nem todos são bons, nem todos são pessoas que quisessemos como vizinhos mas a culpa é da falta de organização e de triagem que os deixa à vontade para atirarem pedras.
4. a pressão do grupo leva pessoas pacíficas a atos impensados - manter os refugiados acumulados aos milhares a desesperar vai resultar apenas em confrontos cada vez mais graves.
5. atirar pedras à polícia é um ato natural para muitos deles (há lá muitos jovens palestinianos que foram educados na escola da intifadah) mas isso não lhes serve de justificação, e apenas dá munição aos haters.
6. há lá no meio pessoas que só aproveitaram a onda - uma rapariga, serenamente sentada à sombra, dizia aos jornalistas que não era pior do que a faixa de Gaza (o que são pedras, canhões de água e gás lacrimogéneo para quem estava habituado a rockets e metralhadoras?) e tinha resolvido sair da Turquia onde vivia para tentar a sorte na Alemanha.
7. continuo a arrepiar-me com o número de crianças pequenas no meio de tudo aquilo - um bebé num ovo a meia dúzia de metros de canhões de água e gás põe-me doida
8. uma mãe que diz que volta para a Síria desde que lhe salvem a filha parte-me o coração - eu criava a menina dela com todo o amor mesmo para lha devolver daqui a uns anos (onde raio andam a UNICEF a Save the Children e outras que tais?)
9. há bandeiras do estado islâmico entre os refugiados que estão a dar problemas na Alemanha - o primeiro erro foi deixá-los concentrar-se aos milhares sem a devida organização - aí não há bondade que aguente - quem dá problemas depois  de ter sido acolhido com humanidade deve ser posto num avião de volta ao país dele (um convidado que se porte mal na minha casa é posto na rua)
10. last but not least - comunicação - quando ninguém se entende em língua nenhuma, não há orientações específicas e ninguém percebe o que se passa, dá asneira! Que tal uns folhetos em árabe a explicar o que devem fazer e como e onde se devem dirigir para pedir para serem acolhidos? Será que é tão complicado distribuir orientações claras, por lá uma dúzia de contentores com uma mesa e um computador, umas baias e registar todas as famílias com nome, origem, data de nascimento, local de destinho, e dividir a "mob" em grupos mais fáceis de gerir? Dando-lhes alternativas, podíamos pedir-lhes calma e paciência e então excluir os arruaceiros de serviço.

E volto sempre ao mesmo, ou eu sou um génio, ou há muita gente estúpida por aí.

segunda-feira, 14 de setembro de 2015

viver para comer

Ontem, muito por acaso, passei os olhos pelo "peso pesado teen" na SIC e parei quase em horror. Sim, todos devemos ter reparado que nos últimos anos o múmero de pessoas obesas é cada vez mais evidente mas eu não parei pelo aspeto dos jovens mas pelas declarações de uma mãe que eram mais ou menos isto:
Não sei se sou eu que faço mal mas, se ele gosta, eu compro. À segunda feira vamos às compras e trazemos tudo o que ele gosta. Gastamos cerca de 200 euros.
Desculpem-me lá a brutalidade mas não acham que pais destes merecem uma sova? O que diriam de uma mãe de um miúdo diabético se lhe desse sempre doces, ou da de um celíaco que o deixase comer o que lhe desse na telha, ou da de um alérgico a marico que lhe desse camarões?
Então o que se diz à mãe de um obeso que lhe compra bolachas recheadas de chocolate, salame de chocolate, gelados aos quilos e lhe dá para jantar uma travessa de batatas fritas e bifes com natas e o vê em frente à televisão a devorar pacotes de batatas fritas, salsichas da lata e litros de coca-cola?
Juro que não percebo.
Apetece-me chegar àqueles pais e gritar-lhe que se os filhos estão gordos e infelizes a culpa é deles que os envenenaram durante anos. Sim, porque muitos são obesos e disformes desde os 4, 5 anos. Com essa idade eles comem o que os pais dão e o que os pais deixam. Não comprar e não ter em casa doces e fritos e molhos e alimentos processados podia não evitar completamente o problema - às vezes há causas genética e hormonais- mas ia ajudar muito.
Ocorre-me novamente - sim, porque é uma ideia antiga que eu tenho - se deixar uma criança chegar a tal estado não é razão para a CPCJ declarar o garoto vítima de maus tratos. É que isto, ao contrário de uma dúzia de palmadas no rabo, vai incapacitá-los para a vida toda, e deixar marcas no corpo e na alma, mesmo que consigam reverter a doença. Porque é uma doença. Alguém diga isso veementemente - estes pais andam há mais de dez anos a tornar os filhos doentes.
Viver para comer? Comer para morrer!

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Radicalismo do século XII


Já que anda tudo por aí com umas ideias da época das trevas, prontos a reabilitar as fogueiras, a  inquisição, a guilhotina, os campos de concentração (ainda hoje me disseram que era melhor criar uns quantos para os refugiados!!!!) adoptei a tendência e fui também ao século XII buscar umas ideias a um tal de Francisco de Assis (eu sei que ninguém sabe se foi o rapaz que fez isto ou não mas como também ninguém sabe o que anda para aí a dizer, que se lixe!):
"Senhor, fazei-me instrumento de vossa paz.
Onde houver ódio, que eu leve o amor;
Onde houver ofensa, que eu leve o perdão;
Onde houver discórdia, que eu leve a união;
Onde houver dúvida, que eu leve a fé;
Onde houver erro, que eu leve a verdade;
Onde houver desespero, que eu leve a esperança;
Onde houver tristeza, que eu leve a alegria;
Onde houver trevas, que eu leve a luz.
Ó Mestre, Fazei que eu procure mais
Consolar, que ser consolado;
compreender, que ser compreendido;
amar, que ser amado.
Pois é dando que se recebe,
é perdoando que se é perdoado,
e é morrendo que se vive para a vida eterna."
Gajo mais radical este Chico lá do século XII. 

isto de sermos como somos

Experimentem perguntar sem mais nem menos  alguém "És racista?" Aposto que invariavelmente a resposta é não! Ninguém, ou por ser verdade ou pela educação, tem coragem de dizer que sim. Porque lá no fundo todos aprendemos que os portugueses não são racistas. Que as nossas famílias não são racistas. Que ser racista é uma coisa pior que quase tudo. E recostamo-nos na cadeira da esplanada e ficamos contentes com o nosso amigo e com o nosso país e connosco. Mas logo a seguir ao veemente não, vem a piada do costume "Eu cá tanto aperto a mão a um branco como o pescoço a um preto" ou outra chalaça do género e todos se riem porque além de não serem racistas os portugueses têm cá um sentido de humor!
E depois eu vou ao supermercado ao fim da tarde e todas as caixas têm uma fila grande menos uma - não, não é a que está fechada nem a das grávidas, é a do empregado preto. Não estou a gozar. É verdade e não é a primeira vez! Sorte a minha que detesto filas porque o funcionário é competente e simpático e dá-me sempre o maior sorriso do mundo quando lhe digo boa tarde. E já vi o mesmo acontecer em três supermercados diferentes com pessoas diferentes mas sempre o mesmo resultado.

Simultaneamente hoje, neste momento, há centenas (eu sei que são milhares mas é demasiado deprimente) a vociferar na internet em mau português em defesa dos pobrezinhos e dos sem abrigo e dos desempregados que ninguém ajuda para só para justificarem o facto de não quererem cá refugiados- não é por racismo, por xenofobia, por maus fígados ou deformação de personalidade. Não, é por peninha dos que cá estão a passar tão mal. Curioso, quantos deles terão estendido uma mão, alimentado uma família, doado alimentos? Quantos deles vociferaram antes? Não vi por aí nenhuma manifestação nem campanha a favor dos desfavorecidos de cá, sim, porque se tivesse havido alguém tinha ajudado- suspeito eu que nenhum dos que agora gritam. Mas agora vou deixar de me preocupar porque cada uma dessas pessoas tão preocupadas com os concidadãos vai levar um para casa, vai pagar medicamentos a um doente e visitar um idoso solitário e então sim isto vai ser um país como deve ser!!! (Oh bolas, eles até faziam isso mas depois já não tinham o que atirar aos refugiados! E assim como assim, para evitarem males maiores limitam-se a berrar detrás de nicknames e posts anónimos).
 Os que vomitam declarações ácidas de PH1 contra refugiados migrantes imigrantes muçulmanos, terroristas e tudo no mesmo saco, devem ser os mesmos que já berraram contra o RSI, contra o casamento homossexual, contra os brasileiros, e os retornados e os chineses e os benfiquistas ou os portistas ou os sportinguistas e os gregos e os gabinetes de apoio a toxicodependentes e a interrupção voluntária da gravidez sem e a educação sexual nas escolas e qualquer coisa que lhes permita ser patrióticos e firmes nos seus valores morais.
Á mulher de César não lhe basta ser séria... E aos portugueses parece que basta parecerem bonzinhos.




quarta-feira, 9 de setembro de 2015

o medo

http://translatingcuba.com/the-persistence-of-fear-ernesto-morales-licea/

Há um fado da Amália que se chama o medo e diz, "o medo mora comigo/ mas só o medo".
O medo mora em todos nós um bocadinho. Toda a gente tem medo de alguma coisa: ratos, aranhas, escuro, aviões, alturas. O medo, que é comum aos animais, é o nosso garante de sobrevivência que viaja connosco desde o início dos tempos e nunca nos abandona. E ainda bem. Mas diz o fado que o medo nos isola, tolhe, aprisiona.
É esta a nossa batalha diária de sermos humanos. Matar ou morrer. Lutar ou fugir. E o medo que nos comanda, e a razão e os sentimentos que nos travam ou impelem a avançar.
Eu tenho vertigens. E basta às vezes um metro de muro para me sentir à beira do abismo, à beira da queda, à mercê do medo que é físico, acelera a pulsação e a respiração, contrai os músculos, arrepia a pele e gelo da cabeça aos pés. Bloqueio ou grito? Aí, é quando eu rebusco as forças da minha consciência e digo a mim própria "calma, é um metro, deste lado há terra, se caíres não te magoas, é só um passo e acaba". Um passo e venci o medo e não me aconteceu rigorosamente nada.
O medo, mora nas notícias, nos blogs, nas páginas de facebook. Há muita gente bloqueada - é o medo dos outros. Há muita gente a fugir - é o medo de morrer. Há muita gente a gritar - é o medo de enfrentar o abismo ou de cair nele. O medo mora comigo. O medo mora com eles. Mas só o medo.
Eu também tenho medo. Sou como o Churchill - tenho medo do medo. do medo animal e irracional. Mas também sei que o medo é meu amigo.
Já que toda a gente tem uma solução para os refugiados - ainda que um número incrivelmente grande ache que é atirá-los ao mar com uma grande pedra ao pescoço- eu deixo aqui as minhas:
1. quem já chegou, já chegou - é acolhê-los de forma humana, reparti-los pela Europa, família por família, localidade por localidade, apoiá-los de início e dar-lhe condições para se tornarem independentes e para se integrarem, mantendo uma vigilância discreta, não vá o diabo tecê-las e alguns serem mesmo terroristas.
2. quem está a caminho, não volta atrás - é criar estruturas de apoio ao longo do percurso para que não continuem a chegar pessoas apavoradas a uma barreira em que o medo de não passar e o instinto de matar ou morrer nem que seja a lutar por sentirem que não há para onde fugir originam os conflitos que temos visto; se as Nações Unidas ou qualquer outra organização reconhecida criassem balcões de registo na Turquia, na Grécia, na Sérvia onde pudessem ser registados os refugiados, verificadas as identidades e depois encaminhados, muita violência se poderia evitar.
3. quem ainda não partiu, precisa de condições para ficar- é preciso travar a guerra a morte e a exploração na origem, criar zonas protegidas, corredores de segurança e insistir num cessar fogo. Quase todos fogem porque não têm condições de ficar. Porque o medo os impele a salvarem-se.
4. refugiados e países de passagem, destino e acolhimento - colocar no terreno mediadores: psicólogos, tradutores, negociadores e não soldados armados (alguns armados em parvos) e cães.
5. informar refugiados e europeus uns sobre os outros - para os refugiados nós somos os sortudos que vivem no paraíso com luxos inacreditáveis como água e o direito de dormir à noite; para nós eles são ou um monte de gente compreensivelmente desesperada (embora com alguns arruaceiros pelo meio) ou uma horda de terroristas que vêm para cá por bombas e roubar empregos (como se eles não estivessem fartos de bombas)
6. criar condições para que rapidamente quase todos possam volta à sua terra e reconstruir o seu país - que é o que quase todos querem: nem que para isso (perdoem-me porque eu sou profundamente pacifista mas sei que há males que não se tratam com aspirina) seja necessário atacar fortemente o estado islâmico e não me digam que os serviços secretos e os exércitos altamente especializados deste mundo não sabem onde eles estão nem se lembram como treinaram os seus lideres para agora preverem como os travar.
7. apelar à calma interior e exterior e vencer o medo tendo coragem para dar um passo.
Senhor Ban -ki-moon, e senhor Guterres, se quiserem eu ajudo-vos a organizar isto e nem levo caro (as Nações Unidas são um monstro macrocéfalo que se alimenta dos fundos que deviam ser destinados a estas coisas, e eu não quero ser um peso grande demais).

Se eu tenho medo que os refugiados tragam uma enorme instabilidade à Europa e prejudiquem alguns ou todos nós, eu tenho. Mas recuso-me a ficar em cima do muro congelada de costas para quem tem tanto ou mais medo do que eu. Há malucos assim... graças a deus, tenha lá deus o nome que tiver.Amália

quinta-feira, 3 de setembro de 2015

Isto e os outros

Toda esta questão dos "migrantes" daria muito para rir se não fosse tão trágica. Para rir da ignorância, dos horizontes estreitos, das mentes quadradas, das declarações políticas idiotas.
Mas eu, que declaro sofrer de um problema chamado sensibilidade, não tenho vontade de rir. Tenho lido as mais incríveis teorias xenófobas e neonazis a propósito disto tudo. Que é sensasionalismo, que é manipulação, que há muito quem precise de ajuda por cá, que é um problema dos outros.
Mas sabem o que isto me faz lembrar? Timor Leste. Eu lembro-me de me vestir de branco, de fazer cartazes e manifestações e de o mundo inteiro ficar calado, calado... Lembro-me de um barco lançar flores ao mar e o mundo calado... Lembro-me da minha raiva de adolescente e da impotência de não haver ninguém que estendesse uma mão àquele povo. Até aparecer petróleo e os Americanos e os Australianos terem tido uma inspiração humanista e solidária e resolverem o problema.
Agora ir meter o nariz no vespeiro da Síria e incomodar estes e outros na Turquia, no Iraque, na Líbia por causa de uma guerra dos OUTROS (tão outros que até têm outra religião, veja-se lá!) isso é que não.
Os americanos dizem que é um problema europeu, os europeus empurram uns para os outros, empurram para debaixo do tapete ou do mar ou do arame farpado (o que estiver mais à mão). As instituições internacionais não se mexem, não aparecem. Todos os que têm poder e responsabilidade falam falam falam falam mas eu não os vejo a fazer nada.
Por um lado eu entendo que não se pode simplesmente abrir as portas indiscriminadamente mas menos entendo que ninguém atue perante os governos dos países de origem destas pessoas, que ninguém esteja a implementar um plano e a organizar as coisas de forma mais serena.
Eu cá se tivesse andado um mês com um filho ao colo para o salvar da guerra, sem dinheiro, sem roupa, sem comida ou água também não ia chegar a uma barreira e dizer delicadamente "Senhor polícia eu gostaria de passar airosamente pelo seu país para chegar a outro onde pudesse criar a minha família em segurança, importa-se? Obrigadinha e bom dia."
E depois temos os iluminados cidadãos deste país a dizerem que não estão para pagar para alimentar os OUTROS lá das arábias e da África mas eu cá digo que preferia alimentar os outros do que suportar os desmandos,as luvas e as megalomanias dos políticos de cá.
Chamem-me sentimentalona, chamem-me altruísta, chamem-me generosa, chamem-me humana, chamem-me mulher mas eu não posso admitir que alguém justifique ou aprove ou ainda louve a situação desumana dos refugiados. Não admito. É cruel, é torpe, é monstruoso que milhões de pessoas educadas em países e sociedades evoluídas, com valores e reconhecimento pelos direitos humanos façam de conta que é com os outros. E lá no fundo da minha memória (tão no fundo que é uma memória mais antiga que eu) há um alarme que soa e me diz que já vi isto antes, tantas vezes antes e a humanidade não aprendeu nada.
in:http://www.praguepost.com/viewpoint/35290-stopping-the-syria-contagion
O que me preocupa mesmo é o leão Cecil, o cão Sam, as ruínas de Palmira e a novela nova da SIC. O resto é lá com os outros.

segunda-feira, 13 de julho de 2015

Ao contrário de Robin Hood

Soube hoje de uma das coisas mais revoltantes que ouvi nos últimos tempos – e olhem que não tem havido falta de coisas revoltantes neste país!
Ora uma certa pessoa, bem-falante e considerada, defensora da lei e da moral que tem passado airosamente por várias instituições (embora não apareça na televisão), para além de outros pecados menos nauseantes, tem, mercê da sua posição numa instituição com ligações à igreja, andado a – eu ia escrever “desviar” mas não vou em eufemismos – roubar comida aos pobres.
Repito, ROUBAR ALIMENTOS AOS POBRES. Ora isto é, - e cito-me a mim própria- o cúmulo do nojo. É que roubar alimentos doados (se calhar por gente que abdica de parte do pouco que tem para matar a fome a um conterrâneo) para fazer jantaradas e festas é de revirar o estômago. Porque uma coisa é aquilo a que já estamos habituados: fundos desviados, um favor aqui, uma cunha ali, gastar o dinheiro dos amigos, boatos disto e daquilo. Outra coisa é alguém com o ar mais deslavado do mundo pegar numas caixas de comida destinadas a alimentar velhos, crianças e doentes e levá-las para fazer uns brilharetes aos amigos e conhecidos e ficar com fama de mãos-largas. Eu até conseguia encontrar atenuantes se fosse para matar a fome aos filhos ou aos pais mas para “armar ao pingarelho” é que ninguém pode admitir! É a total falta de caráter, de valores, de humanidade. É ser mais sujo que o esgoto.
Eu bem podia chamar os bois pelos nomes mas- agora vou armar-me em jornalista- a alegada ladra não pode ser mencionada porque o caso está em investigação e é preciso respeitar o segredo de justiça e blábláblá. Na verdade, a dita pessoa corre é o risco de levar umas lambadas bem assentes e eu não quero ser acusada de incitar à violência, até porque qualquer pessoa é inocente até trânsito em julgado (isto dependendo do julgador e dos advogados e das incorreções processuais, naturalmente). Eu cá, que nunca vi a criatura em questão, - graças a deus- estava capaz de lhe dar uma valente sova. Ou, já que este país anda numa de referências bíblicas, entrançar umas cordas e expulsar os vendilhões (neste caso, ladrões) do templo e admitir que é mesmo mais fácil fazer passar um camelo por um buraco de uma agulha do que um rico (verdadeiro ou fingido) entrar no reino dos céus. (Agora que penso nisso, na cadeia já não é bem assim, felizmente.)
O que me deixaria ainda verdadeiramente triste era se a carapuça começasse a servir em tanta cabeça que fosse como aquela anedota em que fugiram dez malucos do manicómio, já apanharam cinquenta mas nenhum é dos que fugiu. Como otimista que sou, ainda me resta alguma esperança na honestidade das pessoas e nas histórias que vêm nos livros.

Neste momento, não me resta mais que concluir que ao contrário do Robin Hood, e sem ser na ficção, há mesmo quem roube aos pobres para dar aos ricos.

sábado, 27 de junho de 2015

Je suis Tunisie

Quem me conhece, sabe do meu profundo carinho pela Tunísia- um país onde já fui feliz, onde fiz amigos que me acompanham até hoje, onde tive os melhores dias de praia de sempre, onde pretendo voltar. Partilhei a minha alegria pela sua “primavera”, pela sua liberdade, pela sua esperança…
Hoje tenho um nó na garganta e choro por dentro. A Tunísia não merecia isto, os tunisinos não merecem isto e, definitivamente, os tunisinos não são isto.
Ouvi agora nas notícias o genro de uma portuguesa que morreu em Sousse e destaco que, no meio do seu sofrimento, ele nunca culpou a Tunísia e os tunisinos- o meu abraço à família. Ficaram-me na memória as informações que deu: a sogra e o sogro costumavam ir de férias à Tunísia e, na primeira vez que foi de férias sozinha, a sogra escolheu a Tunísia porque era um lugar que conhecia bem, onde se sentia segura, feliz e sabia que ia ser muito bem tratada pelo pessoal do hotel. Esta é precisamente a imagem que eu tenho da Tunísia e do povo tunisino.
O que aconteceu em Sousse é algo que ninguém merece, claro, e que nos deve horrorizar a todos. Não é porque os árabes são terroristas ou porque os tunisinos são terroristas! É porque existem terroristas e um ataque assim pode – pode MESMO- acontecer em qualquer país.
Antes que comecem todos a dizer que é o que acontece a quem vai de férias para esses países árabes extremistas e perigosos, digo-vos que estar numa praia em Sousse é como estar na praia da Rocha ou em Albufeira e chegar um rapaz com um guarda-sol, sacar de uma AK-47 e desatar a disparar e matar quarenta pessoas. Tão simples e tão horroroso como isto. E imaginem agora o que nos aconteceria como país se isso acontecesse numa praia do Algarve ou do Estoril ou da Caparica.
Por isso é que hoje eu sou a Tunísia, e todos devemos ser a Tunísia. Porque um atentado destes pode destruir a frágil economia de um país e matar muito mais do que as vítimas diretas. Porque nunca estaremos seguros num mundo em que estas coisas podem acontecer em qualquer lugar. Porque não vamos trancar-nos em casa com medo. Porque qualquer vida perdida para o terrorismo em qualquer lugar no mundo é uma perda para todos nós. Je suis Tunisie.